José saiu daquela sala em frangalhos. Não acreditava no que tinha visto. Desceu e sentou-se ao balcão pedindo mais um whisky. Após séculos a ruiva desceu e sentou-se com ele como se nada tivesse acontecido. Ela exalava sexo. Ele ainda podia ouvir os gritos de prazer da sua mulher sendo possuída por aqueles dois. Sentia o cheiro dos homens que tinham estado dentro dela. Incrivelmente calma ela pediu para irem embora. Entraram na Ferrari vermelha sem palavras. Ele notou a expressão de satisfação da sua mulher. Pudera, tinha passado horas satisfazendo sua libido, seu insaciável apetite sexual com os jovens. E José não conseguia falar nada. Nem ele entendia o porquê. Já em casa foram para o quarto e ele teve uma vontade incontrolável de transar com a esposa infiel. Ela falou que esperasse, pois ia tomar um banho. Voltou toda perfumada, despida e deitou-se oferecida ao lado dele. Ele olhou aquele corpo delicioso a sua disposição, mas por mais que tentasse foi impossível voltar a se excitar. Brochou pela primeira vez na vida, justo quando queria mostrar que era mais homem do que os dois jovens que tinham feito a sua mulher pirar de maneira tão inconseqüente na festa. A ruiva, decepcionada como se não tivesse feito sexo de forma tão maluca recentemente, apagou a luz, virou para o lado e dormiu o sono dos justos.
Mais tarde José perambulou pela casa feito um sonâmbulo sem saber o que fazer nem como encararia a sua esposa devassa e adúltera a partir daquela data, mas principalmente como se encararia ao espelho, já que na verdade consentira com toda aquela situação no momento em que assistira a tudo sem interferir, sem fazer um escândalo indignado, sem ameaçar matar nenhum dos três. Pior, não havia mencionado à sua linda mulher o fato que testemunhara e não pedira a ela nenhuma explicação sobre o seu sumiço. Ao amanhecer, absorto se cortou feio fazendo a barba, porque ao se fitar no espelho viu as caras sorridentes dos dois moleques que tinham comido a sua mulher. Colocou um enorme esparadrapo no queixo e foi tomar uma ducha quente para começar o novo dia. Os gemidos da esposa transando com os dois filhos da puta feita uma gata no cio, não saíam da sua cabeça. Estava todo ensaboado quando acabou a eletricidade. Que hora para um apagão. Terminou o banho com uma ducha gelada, o que o deixou irritadíssimo. Colocando seu terno Pierre Cardin olhou para o saboroso corpo nu da mulher, um convite para agarrá-la e comê-la toda. Afrouxou levemente a gravata e pensou em pular em cima dela, cobri-la de tapas e penetrá-la de frente, de costas, em todas as posições que pudesse inventar. Ficou com medo de falhar de novo, desistiu, apertou bem a gravata e desceu para tomar café.
Ainda não havia empregados na casa e para não perder seu precioso tempo fez apenas um sanduíche de queijo branco. Começou a ler as notícias do dia como fazia habitualmente, quando notou um bilhete em cima da mesa. Era da sua filha de 17 anos avisando que viajara para a Holanda, onde passaria a morar com um amigo, um negão de trancinhas rastafári que ele não suportava. Calma, ele não era racista não, mas o moço era um vagabundo que não trabalhava, não estudava, não tinha cultura e vivia com uma flauta pra cima e pra baixo. Deu-lhe um ódio mortal quando ele leu que a menina mandava beijos para a mãe e para o irmão e que ela e o negão tinham levado os euros do cofre. Espumou de ódio. Não bastava ao negão ter desvirginado e fugido com a ruivinha, tinha deflorado também o cofre. Pensou em chamar a polícia, mas logo mudou de idéia. Não queria explicar a origem dos euros, nem dos reais e dólares e cheques e ações e jóias que ainda estavam no cofre. Quando tirasse férias iria à Holanda, traria a filha pelas orelhas e daria um jeito de tirar o flautista do caminho dela, imaginou decidido.
Pegou a sua Ferrari dirigindo-se à empresa da qual era vice-presidente da área financeira. Muitos compromissos importantes o aguardavam neste dia, inclusive receber a visita de um ministro de estado italiano na parte matinal. Analisaria depois a documentação para várias licitações e concorrências em que a empresa estaria participando. Às treze horas iria a um almoço patrocinado pela federação nacional das indústrias, com os principais executivos brasileiros e a partir das dezesseis horas terminaria suas tarefas com a reunião do conselho administrativo da empresa, onde teria que apresentar relatórios, conclusões e pareceres sobre novos investimentos, além de justificar vários que não tinham resultado bem para os interesses da companhia. Tinha agendada uma entrevista noturna à TV Globo, que queria a sua opinião sobre subsídios agrícolas e restrições impostas pelos países europeus aos produtos exportados pelo Brasil, mas desmarcaria recusando comentários. Era um homem discreto, nunca aparecia, seu rosto era uma incógnita ao público em geral. Era também bem distraído, porque avançou o sinal vermelho e sua Ferrari foi colhida por um Land Rover bem no meio de um cruzamento da Avenida Faria Lima. O automóvel recebeu o impacto e saiu dando piruetas, destruindo-se e soltando pedaços a cada volta. José foi-se batendo todo enquanto pensava o que mais poderia lhe acontecer de ruim.
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