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quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

TADEU E MARIETA - Parte 2


Não sei o que está passando na cabeça de quem está acompanhando esta história. Aliás, muitas vezes nem sei ao certo o que está passando na minha própria cabeça, tantas são as coisas que nela circulam. Mas saibam que esta é, antes de tudo, uma história de amor. E como todas as intensas e verdadeiras histórias de amor, esta também envolve paixão, desejo, lirismo, inveja, ciúme, sexo, brigas, ódio, vingança, poesia e morte, porque amor é a essência da vida e tudo o que nela está contido acontece nas histórias de amor. Você acha que eu estou exagerando e inventando que Tadeu e Marieta começaram a se apaixonar no berço e aos nove anos enfrentaram o mundo pelo amor? Eu só estou contando esta história porque fico emocionado ao lembrar que vi Tadeu e Marieta, dois pequenos amantes, correndo de mãos dadas por uma estrada de terra nos cafundós do centro-oeste brasileiro com muita gente ruim atrás deles, tentando capturá-los. Essa imagem não mais saiu da minha cabeça e enche os meus olhos de lágrimas. Foi assim que fiquei sabendo deste romance incrível. Talvez você desdenhe, talvez você tenha perdido o romantismo ou endurecido o coração com o passar do tempo. Não posso julgar os seus motivos, mas nunca duvide do amor. Não duvide do amor só porque os personagens são dois nenês. Poderiam ser dois anciãos e daí? Bebês e anciãos não podem amar? Se Deus desse alma às pedras até as pedras amariam, se não tivessem os corações endurecidos. Não duvide.

Chegou o esperado dia das mulheres se encontrarem, portanto as crianças teriam oportunidade de também estarem juntas. O colóquio das duas rolava com a profundidade de uma gota de água na pia de uma cozinha, quando as senhoras mandaram umadas babás darem banho nos nenês e prepará-los para o almoço. A prestimosa babá preparou a banheira com água em temperatura agradável, colocou sabonetes, xampus e toalhinhas ao lado e vários brinquedinhos para os bebês se distraírem. Ela pôs as crianças na mesa de apoio e passou a despir Tadeu com ternura, sob os atentos olhinhos brilhantes de Marieta. O menino ficou peladinho e a babá fez o mesmo procedimento com Marieta, que também ficou peladinha sob os muito atentos olhinhos sorridentes de Tadeu.

Eu sou obrigado a fazer nova pausa, antes que alguma mente malévola ou pervertida comece novamente a pensar bobagens achando que lá vem sacanagem na seqüência deste causo, mas não é assim não, já falei que esta é uma história de amor. Lógico que os amantes fazem muita sacanagem juntos e não será diferente com Tadeu e Marieta, mas não agora, uma vez que eles só começaram a fazer sexo loucamente aos cinco anos de idade e aos nove os dois enfrentaram o mundo pelo amor.

Neste momento maravilhoso onde as crianças descobriram seus corpinhos nus, não teve sacanagem não. Teve é uma atração misteriosa, mística e quase sagrada de um pelo outro. Quem acredita ou já viveu uma história de amor à primeira vista sabe que estou dizendo uma verdade absoluta e que isto é possível. E muito mais ainda com bebês, a pureza humana ainda não corrompida. Tadeu e Marieta quando se viram juntos e peladinhos naquela banheira, sentiram a alegria imensa dos que vivem e se conhecem há anos e ainda tem prazer em compartilhar os momentos mais simples com o parceiro. Sentiram aquela cumplicidade que somente os amantes que se tornam amigos acima de tudo alcançam em suas vidas. Sentiram o que sente quem vive aqueles romances que não são de fachadas só para comemorar bodas de ouro e trocar alianças novas, quando as alianças das almas envelheceram e se perderam há muito tempo. Tadeu e Marieta conquistaram isso bebês, para inveja de toda a gente que não aceitou aquele amor e para as cabeças maldosas que pensaram que iria acontecer muita sacanagem neste capítulo, mas só viu a sensualidade natural de dois bebês peladinhos brincando e se apaixonando ainda sem saber disso. As crianças se davam tão bem que parecia serem uma só, respeitando os brinquedos que o outro brincava numa sintonia perfeita.
Continuando a estória, Marieta deu um tapinha na água e caiu naquela gargalhada deliciosa de bebê porque assustou Tadeu. Tadeu acabou gostando da brincadeira e também deu tapinhas fortes na água, molhando o rosto de Marieta que nem ligou. E assim, brincando e gargalhando na banheira, Tadeu e Marieta foram se acostumando um com o corpinho do outro.

Três anos se passaram e as desavenças entre os dois ferrenhos adversários só aumentara, tornando-se de interesse público. A contenda era constantemente divulgada pela imprensa em geral. O jornalista que chantageava o banqueiro havia morrido de causas naturais - naturalmente provocadas por espancamento numa madrugada em que chegava à sua residência. Pelo caráter duvidoso e pela quantidade enorme de desafetos que ele tinha o caso logo fora esquecido e arquivado. Quanto ao bandido que acusara o banqueiro de ter contratado o seqüestro do juiz, também acabara tendo morte súbita. Numa briga entre detentos uma faca fora enfiada no peito dele até o cabo. Assim o caso do seqüestro também acabou encerrado por falta de provas. Mas o que deixou o Juiz definitivamente injuriado e possesso foi ver nas revistas de celebridades fotos do banqueiro passeando na Europa. E o namorado dele também estava por lá!

Os homens se fustigavam e as esposas mantinham a firme amizade. Agora, além das conversas vazias, trocavam confidências sobre os seus amantes e ainda por cima perto das crianças, agindo como se elas não estivessem ali. Uma transava com o jardineiro e a outra com o motorista. Contavam animadamente os detalhes de suas perversões sexuais e ficavam enrubescidas, como se realmente tivessem alguma vergonha. No meio das brigas dos pais e da promiscuidade das mães, Tadeu e Marieta se distanciaram de tudo e foram solidificando a atração que nascera entre eles no berço. Aos três anos de idade o melhor momento da vida deles era quando estavam juntos, o que esperavam com extrema ansiedade. A separação era sempre dolorida e deixava as crianças amuadas, sem a mesma vontade de brincar ou comer. As babás percebiam isso sem dar importância ao fato.

O mundo era diferente para Tadeu e Marieta quando estavam lado a lado. Brincar passava a ter um significado especial. Cada peça dos joguinhos ganhava vida saltando para as suas mãozinhas, como vida ganhava o sorriso delas se divertindo para valer. A comida mudava de sabor, os aromas e os temperos se realçavam. A hora do banho então era uma delicia e assim eles cresceram como se fossem dois indiozinhos, sem que a nudez de ambos pudesse ser algo estranho ou pecaminoso. A intimidade que as crianças iam construindo era a intimidade da inocência e dos apaixonados que se entregam totalmente. Muito cedo em suas vidas seriam obrigadas a perder essa ingenuidade infantil, porque haviam conquistado um amor maduro que assustaria e chocaria pais, mães, vizinhos, religiosos, professores, pais dos coleguinhas da escola, policiais, médicos, psicólogos, a opinião pública e até a imprensa. Os pais, de forma vil e canalha, movimentariam todos os recursos para impedir o romance e afastar as crianças.

Alheios a isso, numa dessas brincadeiras após o banho Tadeu e Marieta limpinhos e cheirosinhos brincavam no tapete da sala em harmonia de se admirar. Só um artista com o refinamento de um Eugene Delacroix ou a expressividade densa de um Van Gogh poderia reproduzir inteiramente a beleza da cena dos dois pimpolhos transbordando alegria. Eles se abraçavam, pegavam, empurravam, apertavam e gargalhavam, até que Marieta tropeçou e caiu em cima de Tadeu, que foi de costas ao chão segurando a amiguinha em seus braços. Sem querer os lábios deles se tocaram. O tempo pareceu parar e eles ficaram imóveis. Nunca os olhos das duas crianças haviam chegado tão perto. Os olhos verdes de Marieta e os olhos negros de Tadeu acenderam uma luz tão intensa que iluminou todo o ambiente.

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