Tadeu e Marieta saíam da rodoviária de mãos dadas e sorrindo,
quando de repente ouviram o engatilhar de armas. Sem pestanejar os bandidos
dispararam contra as crianças, mas não se ouviu nenhum tiro ou grito. Não se
viu nenhuma bala atravessando o espaço ou uma gota de sangue pingar. O tempo
pareceu ter parado porque Tadeu e Marieta, que haviam se apaixonado no berço
quando trocaram suas chupetas e foram se acostumando com o gostinho um do outro
entrelaçando as suas almas; que depois foram se acostumando com os corpinhos
nus um do outro de forma pura e natural ao tomarem banho juntos; que depois,
aos cinco anos, começaram a fazer sexo alucinadamente porque tinham um amor
maduro e verdadeiro; que assumiram esse amor e foram seqüestrados aos sete
anos, ficando dois anos em cativeiro convivendo com a natureza e alimentando
diariamente o profundo sentimento que tinham um pelo outro; que fugiram aos
nove anos de idade de assassinos, polícia, caçadores de recompensa, imprensa e
povo, enfrentando o mundo única e exclusivamente pelo amor, procurando um lugar
para simplesmente vivê-lo em paz, juntos, só eles e o amor;
Ao ouvirem as armas sendo engatilhadas eles se beijaram o
beijo mais intenso e denso que poderia ser dado por dois amantes. Um beijo com
a mesma paixão de quando eles fizeram sexo pela primeira vez. Nesse momento
eles não existiram mais, porque os dois só existiam um no outro e em lugar ou
tempo algum. Simplesmente quiseram desaparecer e desapareceram naquele beijo
que selava o amor de suas vidas. Evaporaram deixando no ar um delicioso e
marcante perfume de jasmim.
Você está pensando que nada disto aconteceu. Não se lembra de
ter lido nenhuma página a respeito nos jornais e revistas semanais ou assistido
qualquer debate discutindo assunto semelhante. Você nunca tomou conhecimento de
qualquer menção desses fatos nos noticiários de televisão. Nunca soube de shows
pelo mundo ou no Brasil em apoio ao amor de duas crianças tão pequenas. Não ouviu discursos inflamados aqui e no
exterior de ONGS dando apoio ou associações conservadoras criticando tamanha
paixão, que levou duas crianças a fazerem sexo enlouquecidamente a partir dos
cinco anos de idade. Não viu perseguições, não acredita no seqüestro ou num
juiz federal assassinando um bilionário criminoso. Não houve, em sua opinião,
uma escola deflagrando a condenação ao amor das crianças quando elas tinham
sete anos, não existiram mães alienadas, caseiros bondosos, nem os assassinos
perversos. E finalmente você tem certeza de que as crianças não se evaporaram
num beijo, quando enfrentaram o mundo aos nove anos de idade por um amor que só
cabia no infinito e em todos os tempos.
Só que eu estive em Cuiabá há muitos anos atrás para promover
o início da construção de uma grande indústria. Ficaram gravadas para sempre na
minha mente as cenas das duas crianças saltando de um Jeep esverdeado e
correndo de mãos dadas pelo terreno pedregoso na minha direção. As minhas
pupilas ainda recordam os olhos negros do menino de cabelos pretos e os olhos
verdes da menina de cabelos dourados rogando ajuda com as expressões mais
meigas que já vi. A minha memória perpetuou a história que me contaram quando
os levei na perua da empresa e o último momento em que os vi montados na moto
empinada rasgando a rodovia. Também nunca esquecerei os seus nomes: Tadeu e
Marieta.
Talvez você tenha razão em duvidar. Talvez eu tenha inventado
tudo isto. Talvez Tadeu, Marieta e sua história de amor tenham se evaporado sem
deixar vestígios. Ou você está sentindo agora um forte perfume de jasmim no ar?
FIM
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