Tadeu e Marieta
se dirigiram para a rodovia Transpantaneira, distante 102 quilômetros de
Cuiabá, imaginando alcançar o porto de Corumbá para escapar do banqueiro, dos
assassinos, da polícia, da imprensa, do povo, do dono da moto roubada, das
pessoas que viram o roubo da moto no posto, dos caçadores de recompensa e do
mundo que era contra o imenso amor que eles tinham um pelo outro. Queriam
apenas desaparecer pela vida e encontrar um lugar em que pudessem viver em paz.
Passariam antes pela casa do juiz para pegar roupas, dinheiro e depois
viajariam pelo planeta até serem esquecidos completamente. Ficaram eternamente
gratos ao publicitário que os salvara e de quem não puderam nem se despedir,
mas o homem, mesmo sem entender a situação, ficou muito feliz em ajudá-los e
nunca mais se esqueceu dos rostos meigos daquelas crianças, nem da cena delas
pulando do Jeep esverdeado, correndo pelo terreno cheio de pedras de mãos dadas,
e principalmente do roubo da moto.
Em São Paulo o
banqueiro entrou em pânico, ordenou aos capangas que encontrassem as crianças a
qualquer preço e acabassem com Marieta. Acontecesse o que acontecesse ele já
tinha providenciado altíssimo pagamento aos assassinos para depósito assim que
tivessem concluído a missão. Nesse ínterim a polícia federal e a polícia de
Cuiabá descobriram o cativeiro na fazenda, a matança dos empregados, o desaparecimento
dos caseiros, o Jeep abandonado e o roubo da moto por duas crianças. Foi fácil
juntar as peças e concluir que se tratava de Tadeu e Marieta. O juiz, que nunca
mais voltara ao trabalho e havia se entregado ao álcool, quando soube da
novidade reviveu. Já o banqueiro começou a pensar seriamente em sair do país e
se esconder em Paris. A sua esposa e a do juiz já estavam vivendo na Europa. Só
não tomou essa atitude imediatamente porque ficaria esquisito e suspeito demais
ele sumir justo quando a polícia começava a desvendar o caso. Mal sabia ele que
o pior estava por vir, mas ligou para o namorado dizendo que estava com
péssimos pressentimentos.
A viagem de moto
até a cidade de Poconé no início da rodovia Transpantaneira levou muito tempo e
foi cansativa. No dia seguinte os dois iniciaram outra viagem repleta de
perigos, pois além de terem em seu encalço os assassinos seqüestradores, a
polícia de Cuiabá pelo roubo da moto, caçadores de recompensa atrás de um
bilhão de reais e a imprensa que já descobrira a fuga deles, várias partes da
estrada eram quase intransponíveis, com precárias e improvisadas pontes de
madeira, enormes buracos na pista, alagamentos, charcos e muita lama. Só
compensava admirar a belíssima paisagem e as revoadas sem fim das araras e garças.
Não era incomum a pista ser atravessada por veados, jacarés e capivaras. Muito
atentas aos perseguidores e saindo da estrada para se esconderem, as crianças
seguiram cuidadosa e vagarosamente ao nascer do sol e descansaram ao escurecer,
pernoitando bem próximo de uma pousada que circundava a rodovia. Claro que
nesse momento aproveitaram para fazer sexo loucamente à luz da lua e sob o teto
das estrelas, porque o amor delas só cabia no infinito e era além de qualquer
tempo. Tadeu e Marieta haviam assaltado um posto de gasolina para abastecerem a
moto em outro, o que só iria aumentar a perseguição deles pelas autoridades. A
situação era completamente maluca, pois a polícia federal e a de São Paulo
procuravam as crianças para protegê-las e salvá-las, mas ninguém sabia ainda
disso, portanto a confusão era total. Literalmente aos trancos e barrancos o
jovem casal chegou ao município de Porto Jofre, no pantanal mato-grossense e
depois ao porto fluvial de Corumbá, onde embarcaram como clandestinos num navio
de carga que navegaria rumo ao Paraguai.
Enquanto a fuga
das crianças era divulgada pela mídia no mundo todo, a polícia federal
encontrou e prendeu os caseiros na residência de familiares. Primeiramente
foram tratados como suspeitos, mas quando começaram a relatar o que sabiam e o
que haviam feito para salvar as crianças, tornaram-se as principais testemunhas
do hediondo crime. Em sigilo absoluto foi emitida uma ordem de prisão imediata
contra o banqueiro, mas antes que ela fosse cumprida um velho delegado que participava
da apuração do seqüestro ligou e contou ao aposentado juiz a verdade dos fatos.
Após tomar quase meia garrafa de OldParr o destruído guardião das leis e da
justiça telefonou para o banqueiro, disse que precisava conversar sobre os
novos rumos do seqüestro e foi convidado a ir até a casa do inimigo. Pegou na
gaveta um revólver calibre 38 cheio de munição e quando estavam os dois
trancados no escritório do vizinho tomando um whisky gentilmente servido pelo
pai de Tadeu, chegou bem perto dele e apontou a arma para a cabeça do covarde e
traiçoeiro bilionário.
Só deu tempo do
homem arregalar os olhos e ouvir o tiro que espatifou o seu cérebro. Nesse
instante a polícia já havia cercado a casa, arrombando em seguida a porta do
escritório e dando com a cena do banqueiro morto esvaindo-se em sangue. O juiz
bebia calmamente mais um copo de whisky, esse do finado adversário. No dia
seguinte a imprensa mundial contou a reviravolta do seqüestro das crianças que
se amavam desde o berço e que haviam conseguido fugir dos raptores. O juiz foi
preso, mas o flagrante relaxado imediatamente com a alegação de legítima
defesa. Era um homem em frangalhos, tinha se tornado na essência um assassino,
mas cumprira a principal missão de sua vida: acabar com o banqueiro.
A aventura das
crianças continuou em Assunción, capital paraguaia. Espertamente Tadeu e
Marieta conseguiram embarcar em um ônibus de sacoleiros brasileiros que haviam
subornado a polícia alfandegária para contrabandearem os mais diversos
produtos, principalmente falsificados, para o Brasil. Escondidos no fundo do
veículo foram acordar abraçadinhos ao chegar a Curitiba, primeira parada do
fretado. As precoces e geniais crianças esperaram os passageiros descerem e
depois desembarcaram sem saber que os assassinos contratados pelo banqueiro
estavam espalhados pela rodoviária à procura dos amantes sem idade. Os maldosos
tinham feito um cerco em vários estados onde possivelmente os pequenos pudessem
aparecer. E após a morte do mafioso-chefe os bandoleiros tinham agora outra
missão ordenada pelo novo líder da quadrilha, o namorado do extinto. Além de
Marieta, que matassem também a Tadeu, o único filho, o principal herdeiro da
bilionária fortuna do empresário criminoso. O menino era o grande empecilho
para que os negócios ilícitos do grupo empresarial do falecido tivessem seqüência,
uma vez que a mãe de Tadeu e seus amantes eram fáceis de manipular.
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